amores expresos

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

FANTASMA

Imagino que seja possível separar os autores que participam deste projeto em dois grupos: de um lado, os que migram com seus companheiros ou, de alguma forma, acabam encontrando e se relacionando com amigos brasileiros que vivem no local; e, doutro, os que viajam sozinhos e evitam seus nacionais ou conhecidos em geral. Como deu pra notar, faço parte do segundo grupo.

Minha intenção foi a de mergulhar de cabeça na piscina vazia (pra usar um clichê literário), de me relacionar com Sydney no extremo da passividade (da contemplação), dentro das limitacoes cognitivas de quem nunca a visitou, de quem (até sem querer) acabou despido das garantias da sua rotina brasileira, da ego trip, sem o cirquinho-muleta, sem as facilidades "de redor" que cada um de nós sempre acaba montando (é uma solução natural de defesa, tudo bem).

Na maioria das horas, vago feito um fantasma, em silêncio, observando (e sujeito às conexoes mais absurdas): longas viagens de ônibus até os bairros (condados) distantes, como Parramatta, diálogos utilitários e sem oferecimentos, almoços solitários na mesa pra dois do restaurante, caminhadas malemolentes em meio ao turbilhão de executivos nas ruas centrais, a estagnação em meio ao número absurdo de universitários brasileiros gastando sua juventude em aulas de inglês de aproveitamento questionável e trabalhando feito burros de carga (aviso aos irritadinhos que não vejo nada de errado em gastar a juventude, ela gastará de qualquer jeito; e não há mesmo o que altere essa rota).

Na poesia é comum partir de um sentimento, de um momento em que se corporifica uma imagem, uma exultância - em que algo se precipita como a cura que o Céline sugere nos seus livros. Não acho que isso funcione num projeto como o Amores Expressos (não há como progredir apenas na, e de, inspiração quando o alvo deverá ao romanesco).

Estranho ao máximo esta experiência de blog no formato tradicional.

Não sei falar da minha vida, não gosto de expor a minha vida (o Sanduíche de Anzóis, o blog do Elrodris, funciona como o meio mais eficiente para eu tirar onda com a inquebrável redoma das literatices, serve também pra divulgar as coisas notáveis em geral e chutar alguma poesia). Neste momento, tenho até uma certa inveja de quem consegue fazer isso com graça e sem pudor.

O amigo Eduardo Nasi me disse uma vez: se tu escrevesse sobre essa tua rotina agitada e esquizofrênica daria um baita caldo.

Pois é.

Hoje, acordei as oito.

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